sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Um em cada 4 professores da educação básica não tem graduação

Aproximidamente 25% dos professores que trabalham nas escolas de educação básica do país não têm diploma de ensino superior. Eles cursaram apenas até o ensino médio ou o antigo curso normal. Os dados são do Censo Escolar de 2011, divulgado neste mês pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep).
Apesar de ainda existir um enorme contingente de professores que não passou pela universidade ¿ eram mais de 530 mil em 2011 ¿ o quadro apresenta melhora. Em 2007, os profissionais de nível médio eram mais de 30% do total, segundo mostra o censo. Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão, os números são mais um indicativo de que o magistério não é uma carreira atraente. "Isso mostra que as pessoas estão indo lecionar como última opção de carreira profissional. Poucos profissionais bem preparados se dedicam ao magistério por vocação, uma vez que a carreira não aponta para uma boa perspectiva de futuro. Os salários são baixo e as condições de trabalho, ruins", explica.
A maior proporção de profissionais sem formação de nível superior está na educação infantil. Nas salas de aula da creche e pré-escola, eles são 43,1% do total. Nos primeiros anos do ensino fundamental (1º ao 5º ano), 31,8% não têm diploma universitário, percentual que cai para 15,8% nos anos finais (6° ao 9º ano). No ensino médio, os profissionais sem titulação são minoria: apenas 5,9%.
Para a presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Cleuza Repulho, é um "grande equívoco pedagógico" colocar os professores menos preparados para atender as crianças mais novas. "No mundo inteiro, é exatamente o contrário, quem trabalha na primeira infância tem maior titulação. Quando o professor entra na rede, vai para a educação infantil quase como que um 'castigo' porque ela não é considerada importante. Mas, na verdade, se a criança começa bem sua trajetória escolar, as coisas serão bem mais tranquilas lá na frente", afirmou.
Segundo Cleuza, o nível de formação dos professores varia muito nas redes de ensino do País. Enquanto em algumas cidades quase todos os profissionais passaram pela universidade, em outras regiões o percentual de professores que só têm nível médio é superior à média nacional. "Temos, às vezes, uma concentração maior de professores sem titulação em alguns locais do Brasil, como a Região Norte, por exemplo, onde as distâncias e as dificuldades de acesso impedem que o professor melhore sua formação", disse ela.
O resumo técnico do Censo Escolar também destaca que em 2010 havia mais de 380 mil profissionais do magistério matriculados em cursos superiores ¿ metade deles estudava pedagogia. Isso seria um indicativo de que há um esforço da categoria para aprimorar sua formação. Mas o presidente da CNTE ainda considera "muito alto" o número de professores sem diploma universitário, especialmente porque nos últimos anos foram ampliados os estímulos para formação de professores nas instituições públicas e privadas de ensino superior.
Uma das alternativas para quem já atua em sala de aula e quer aprimorar a formação é a modalidade do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para licenciaturas. O programa paga as mensalidades de um curso em faculdade particular e, depois da formatura, o estudante pode abater sua dívida se trabalhar em escolas da rede pública ¿ cada mês em serviço abate 1% do valor.
"Os programas são oferecidos, mas as condições não são dadas aos professores para que eles participem. O professor não tem, por exemplo, a dispensa do trabalho nos dias em que ele precisa assistir às aulas. As prefeituras e governos estaduais, que deveriam ser os primeiros interessados, acabam não estimulando o aprimoramento", disse Roberto Leão.
Agência Brasil

 

O Brasil ainda tem mais de 730 mil potenciais alunos com idade entre 6 e 14 anos fora das salas de aula


A distância da escola e problemas familiares impedem Pedro de voltar a estudar há mais de um ano
na cidade de Marabá. Foto: Janduari Simões
A distância da escola e problemas familiares impedem Pedro de voltar a estudar há mais de um ano na cidade de Marabá
Pedro*, 8 anos, é um menino calado. Ele gostava de ir à escola, mas há mais de um ano não frequenta uma sala de aula. O problema começou quando a família chegou a Marabá, a 485 quilômetros da capital do Pará. Os pais estão à procura de emprego e ficam pouco em casa. "A gente não leva ele para a escola porque é longe. Meu marido tem problema de coração e não pode ficar sozinho. Ele também não pode nos acompanhar porque passa mal", conta a avó do garoto.

Infelizmente, a situação de Pedro não é única. Mais de 730 mil crianças e jovens de 6 a 14 anos estão fora da escola como ele. O número, calculado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, demonstra que, apesar de 97,7% da população dessa faixa etária frequentar a escola, ainda estamos longe da universalização.

Há um inegável avanço desde a década de 1990, mas o percentual de 2,3% esconde um enorme contingente de meninos e meninas. "Para que eles sejam incluídos no sistema público de ensino, é fundamental saber quem são, onde moram e quais dificuldades enfrentam", afirma Maria de Salete Silva, coordenadora de Educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil.

Além de tornar universal o acesso ao Ensino Fundamental (obrigatório desde a Constituição de 1988), o país tem a meta de ampliar até 2016 o atendimento aos que possuem de 4 a 16 anos. "Isso representa trazer para os bancos escolares mais de 3,5 milhões de crianças e jovens", avalia Eduardo Luiz Zen, pesquisador do Ipea. Ele calcula que, com base no custo anual por aluno de 2009, o investimento para essa ampliação é de aproximadamente 10 bilhões de reais, cerca de 0,3% do PIB nacional.

"É bom comemorar que quase 98% estão na escola, mas não dá pra achar que está resolvido", enfatiza Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva, secretária de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC).

Segundo o relatório Situação da Infância e da Adolescência Brasileira 2009 - O Direito de Aprender, do Unicef, o universo fora da escola está principalmente na Amazônia Legal, no semiárido e nas periferias de grandes centros. A dificuldade afeta, sobretudo, crianças negras, de baixa renda, em situações de vulnerabilidade e instabilidade familiar ou aquelas que possuem necessidades educacionais especiais (NEEs).

NOVA ESCOLA foi a Marabá, na Amazônia, a Crato, a 588 quilômetros de Fortaleza, no semiárido, e às periferias de São Paulo e Teresina, com a ajuda dos conselhos tutelares, para contar a história de Pedro e de outros quatro jovens e crianças que, assim como ele, têm negado o direito à Educação.

Vulnerabilidade social
Felipe chora ao contar sua história. Dependente de crack, vive entre centros de reabilitação, abrigos e a casa da família, em São José do Egito. Foto: Raoni Maddalena
Felipe chora ao contar sua história. Dependente de crack, vive entre centros de reabilitação, abrigos e a casa da família, em São José do Egito
Felipe*, 11 anos, é dependente químico. Passou por centros de reabilitação, abrigos e tem recaídas ao voltar para casa. Em maio, estava na Associação Cristã Esperança e Vida (Acev), em Crato, sem estudar. Ele diz não ter boas lembranças da escola e nunca conseguiu completar um ano de estudos. Sem finalizar o tratamento na Acev, voltou para a casa dos pais, em São José do Egito, a 404 quilômetros do Recife. Segundo o Conselho Tutelar, continua fora da sala de aula e não foi aceito por causa de sua agressividade.

A pesquisa mais recente sobre o que leva os mais jovens a abrigos foi feita em 2004 pelo Ipea e mostra que, assim como aconteceu com Felipe, a convivência com as drogas é uma das causas. O relatório O Direito à Convivência Familiar e Comunitária: Os Abrigos para Crianças e Adolescentes no Brasil aponta que entre os motivos para a saída de casa estão a carência de recursos materiais (24,5%), o abandono por pais ou responsáveis (18,8%), a violência doméstica (11,6%), a dependência química de pais ou responsáveis (11,3%) e a vivência na rua (7%). Entre as 20 mil crianças e jovens dos 589 abrigos analisados, a maior parte se enquadra na faixa etária de 7 a 15 anos.

O drama das escolas sem banheiro

A realidade das instituições que não possuem sanitários na zona rural brasileira



Observada a distância, a paisagem é bucólica. A singela casa de taipa é uma moradia tradicional no Meio-Norte, região que abrange o Maranhão e parte do Piauí. Sustentada por um gradeado de troncos de babaçu unidos com nós de cipó, tem paredes de barro e cobertura de palha. Resiste a chuvas fracas e, por contemplar frestas para o vento correr, dispensa ventilador mesmo sob intenso calor. Aproveita ao máximo a riqueza da mata dos cocais, como os sertenajos da área fazem há séculos.
Mas não estamos falando do passado. O ano é 2011. O lugar, a zona rural de Caxias, cidade de 155 mil habitantes a 371 quilômetros de São Luís. A casa é, na verdade, uma escola. EM São Gonçalo. A bordo de um veículo utilitário esportivo 4x4, capaz de vencer as irregularidades das estradas de terra, ela fica a cerca de uma hora da zona urbana do município. Em seu interior, 18 alunos de uma turma multisseriada de 1ª a 4ª série assistem à aula da professora Fernanda Pereira da Silva. Sobre o chão de terra, um mobiliário destroçado. Como as cadeiras com encosto não são suficientes, algumas crianças se recostam diretamente na armação metálica. No meio da construção, um velho armário de ferro faz as vezes de biombo entre a sala de aula e outro cômodo. Nele, um fogãozinho de duas bocas com bujão de gás, pilhas de livros didáticos e mantimentos para a merenda disputam espaço com feixes de ramos de arroz - parte da safra do dono da área, um vizinho que cedeu as salas para o ensino, mas ocasionalmente as usa como depósito.
A isso se resume a EM São Gonçalo. Não há quadra, refeitório, laboratório de Ciências ou de informática, internet, telefone, esgoto ou água encanada. Não há banheiro. "Quando alguma criança está apertada", conta Fernanda, "eu entrego o papel e digo para ir ali". "Ali" é uma pequena clareira a 20 metros da escola, nos fundos do terreno, onde a capoeira encontra a mata e um amontoado de papéis usados e embalagens plásticas se acumula. "Ali" é onde os alunos da EM São Gonçalo fazem suas necessidades. "Xixi e cocô", confirma a professora.
Do catálogo de estatísticas educacionais constrangedoras, a quantidade de escolas sem sanitário costuma ser a mais evocada para sublinhar o arcaísmo que, a despeito dos avanços recentes em acesso e qualidade, teima em existir na Educação brasileira. "Banheiro é condição mínima de qualidade para a escola. O poder público precisa garanti-lo", diz Gabriela Schneider, especialista em políticas, gestão e financiamento da Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR). "Mais que um direito básico, ter instalações adequadas é requisito para o aprendizado", reforça Ronaldo Lima Araújo, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) na área de trabalho e Educação. "É conhecida a relação entre o desempenho escolar e as condições do ambiente de ensino."

 

Não basta apenas avaliar, avaliar, avaliar...

O Brasil entrou firme na onda das sondagens de larga escala, mas se não houver impacto na sala de aula os alunos continuarão à deriva


Não basta avaliar, avaliar... Ilustração: Jean Galvão

O movimento ainda é um tanto recente, mas se alastrou rapidamente pelo país. Começou duas décadas atrás, quando o governo federal implantou o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). A primeira edição ocorreu em 1990 e os testes não pararam mais. Interessados em descobrir mais sobre as necessidades específicas de sua rede, logo alguns estados criaram esquemas próprios de investigação. Minas Gerais e Ceará saíram na frente, em 1992, e a onda só cresceu. Hoje, 19 unidades federativas têm ou já tiveram algum tipo de avaliação externa, assim como alguns municípios. Isso é bom, pois identificar deficiências e carências é um passo fundamental para a melhoria do ensino. A questão é que nem sempre o esforço produz o impacto desejado em sala de aula.

A conclusão faz parte da pesquisa
A Avaliação Externa como Instrumento da Gestão Educacional, uma iniciativa da Fundação Victor Civita (FVC). Coordenada por Nigel Brooke, professor convidado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ela demonstra a adesão contundente do país a esse tipo de política pública e ajuda a identificar oito mitos sobre o tema, como o de que "as avaliações são usadas para o replanejamento da escola e da rede" (leia quais são todos eles no quadro).

O estudo mostra que as Secretarias usam as avaliações de várias maneiras, como para premiar escolas e bonificar professores. Quando o uso induz à competição, especialistas apontam riscos, entre os quais o de pôr no mesmo balaio instituições que não são comparáveis e o de estimular fraudes.


A maioria das avaliações traz embutida a finalidade de identificar falhas de percurso para traçar estratégias capazes de melhorar a qualidade do ensino. Mas isso, frequentemente, fica só na intenção. Em primeiro lugar porque ocorrem tropeços na implementação. Um deles: o Brasil não tem um currículo único, detalhado e obrigatório - e, não raro, as redes adotam um sistema próprio de verificação sem antes elaborar seu documento oficial. O resultado é uma confusão no meio de campo: se os mesmos conteúdos não são ensinados a todos os alunos, como checar a aprendizagem deles em larga escala?


Quando a avaliação é feita no fim do primeiro e do segundo segmentos do Ensino Fundamental e do Médio, essa dissonância é discreta porque há certo consenso sobre o que os estudantes devem saber ao concluir essas fases. Se ela for realizada no meio das etapas, no entanto, as discrepâncias entre o que já foi ensinado e o que é testado podem ser mais incisivas. Isso porque não há concordância entre os educadores sobre a distribuição dos elementos curriculares pelos anos e, assim, cada escola trabalha com temas diferentes.


Outro ponto a destacar: persiste na opinião pública e entre alguns gestores expectativa equivocada de que a simples divulgação de
rankings leva à mudança da prática. Um desempenho ruim dos alunos pode até servir como alerta, mas o contra -ataque não é automático. Em geral, docentes e gestores não compreendem o que significam os números referentes à sua rede ou escola - e muito menos conseguem decidir, sozinhos, como reverter o quadro.

Para garantir o aperfeiçoamento constante das práticas em sala de aula, é necessário que a rede ofereça um trabalho de esclarecimento sobre os resultados das sondagens e, mais do que isso, tenha uma política consistente e permanente de formação continuada em serviço para os gestores e os professores. Somente atribuir a culpa por rendimentos baixos aos educadores não é frutífero nem justo. Quanto mais dominarem os conteúdos e as didáticas referentes às disciplinas que lecionam, maiores são as chances de avanço dos alunos. Mas outros fatores entram na equação. Contam o tamanho da turma (quanto maior, pior), o tipo de material didático disponível, a existência de um currículo, o fato de a escola estar ou não em área de vulnerabilidade e o perfil do alunado - já que a bagagem trazida de casa interfere na aprendizagem.


Por fim, ainda que os processos de avaliação externa possam se sofisticar, a ponto de permitir que a cadeia medição-reflexão-ação sempre se complete, é preciso ter cautela para não reduzir o conceito de qualidade da Educação Básica. Afinal, ter proficiência em disciplinas-chave não é tudo o que se espera dos estudantes formados. A concepção de Educação é ampla - e as metas do país devem ser cada vez mais ambiciosas.

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